Atire a primeira pedra quem nunca diminuiu a velocidade só para
passar pelo radar e depois acelerou o carro de novo excedendo o limite
permitido na via. Ou quem jamais acessou as redes sociais e aplicativos que
informam se há blitz da Lei Seca. Indo mais longe. Pare, pense e responda
com sinceridade: já comprou produto pirata? Entrou no Brasil com compras feitas
no exterior sem declarar? Furou a fila alguma vez na vida? Falsificou a
carteira de identidade ou a de estudante só para entrar naquela festa para
maiores de 18 anos quando ainda era adolescente? Essa metralhadora de perguntas
indiscretas – e ao mesmo tempo tão clichê - não tem o objetivo de pregar a
moralidade. É só para lembrar que, sim, os “pequenos desvios de conduta” fazem
parte do dia do brasileiro – o mesmo que ganhou e assumiu a fama do
“jeitinho”. Mas, ao mesmo tempo, deixam a dúvida: os tão falados e
escandalosos casos de corrupção no país seriam um reflexo da sociedade
brasileira? Deveriam os brasileiros comuns, que esbravejam nas redes sociais e
vão aos milhares às ruas protestar contra a corrupção, fazer mea-culpa? Para a
professora da Unesp e especialista em Sociologia da Comunicação, Heloisa Pait,
é preciso separar o joio do trigo. Você, leitor, mesmo que tenha respondido sim
a alguma pergunta acima não precisa se comparar a pessoas como Pedro Barusco
(ex-gerente da Petrobras que confessou ter recebido milhões em propina). “São
coisas muito distintas. Querer justificar a corrupção do tamanho que estamos
vendo ao comportamento do brasileiro é querer banalizar a corrupção, é jogar
uma cortina de fumaça no que está acontecendo”, aponta a especialista. A
análise é semelhante a que foi feita nesta semana pela psicóloga e colunista Roseli
Sayão. Mesmo entre os políticos, ela diz que não se pode
generalizar. “É comum ouvir um jovem dizer ‘políticos só roubam, são
ladrões’. Mas não são todos. Generalizar um particular não é, inclusive, um ato
científico”, disse. Por outro lado, em campanha lançada há dois anos, o
Ministério Público já chamava a atenção para o inverso: a corrupção do
cotidiano pode se alimentar da corrupção política. Mais: a impunidade no alto
escalão pode criar clima para que se reaplique no cotidiano do cidadão
comum. O alerta havia sido feito no lançamento da campanha “o que você
tem a ver com a corrupção”, que mostrava atitudes consideradas comuns pela
maioria como um desvirtuamento ético. Na época, uma pesquisa do instituto Vox
Populi com a Universidade Federal de Minas Gerais apontava que um a cada quatro
brasileiros (ou 23%) acreditava que dar dinheiro a um guarda para evitar multa
não chegava a ser um ato corrupto.
(R7)