Dona Maria das Mercês Silva, 66, sempre teve vontade de estudar. Porém,
por causa do pai – que dizia que lugar de mulher era na cozinha e que iam para
a escola apenas as interessadas em escrever cartas aos namorados –, a sua
primeira oportunidade de estudo aconteceu há apenas dois anos. "Ele [o meu
pai] tirou o meu sonho, porque se eu tivesse aprendido naquela época, hoje eu
era milionária", diz dona Maria, que atualmente trabalha como auxiliar de
limpeza em Curitiba. A vovó, que antes não sabia ler nem escrever, conta que um
dos motivos que a levaram ela a estudar foi ter dificuldade, por exemplo, para
pegar ônibus, já que não conseguia identificar as placas. "Eu não
sabia andar nas ruas, não conhecia os bairros. Nem ler receita de bula de
remédios eu conseguia." Mas não foi só isso que motivou dona Maria a
entrar em uma sala de aula. A grande razão disso tudo tem um nome: Felipe dos
Santos, de 10 anos, neto que é criado por ela desde pequeno. Quando o menino
pedia sua ajuda para fazer as tarefas de casa, a avó não sabia o que fazer.
"Eu começava a chorar porque não conseguia ajudá-lo e aí ele também
chorava". Nisso, o garoto teve a ideia de levar a avó para a escola.
Enquanto ela dizia que "era muito velha [para estudar]", ele a
incentivava: "ô, vovó, vamos lá fazer a matrícula". "Eu não
queria, mas ele colocou na minha cabeça que nem que ele viesse comigo e ficasse
quietinho na sala, eu teria de vir." Hoje, ela agradece o neto.
"Graças a Deus ele me incentivou a vir para escola, porque eu não sabia
nem assinar meu nome. Estou aprendendo um mundo novo", conta ela. Cada um
em sua bicicleta, avó e neto vão todas as noites até a Escola Municipal
Rachel Mader Gonçalves. Enquanto dona Maria tem aula ao lado de 13 alunos que
estão em uma faixa de 36 a 70 anos, na maioria mulheres, em uma das turmas do
2º período de educação de jovens e adultos (EJA) – equivalente ao 4º e 5º ano
do ensino fundamental – Felipe fica na Sala de Acolhimento, onde participa de
atividades de recreação mediadas por uma professora. No período da manhã, o
menino frequenta o 5º ano da Escola Municipal Marumbi.
(IG)