21 março 2012

Por engano, autônomo fica 30 dias preso sob a acusação de homicídio

 
“Vivi o inferno. Toda noite, no meu canto, eu chorava em silêncio. Até porque dormir naquele lugar era impossível, no chão, sem ventilação e num calor insuportável”. O lugar a que o autônomo Marcos Roberto Sabino, 55 anos, se refere é a prisão, onde ele foi parar depois de ser confundido com o principal suspeito de um homicídio registrado em Barueri.

O nome da cidade, cuja grafia se assemelha a de Bauru, levou o Judiciário a cometer o primeiro de uma sucessão de erros que fez Sabino ficar por exatos e longos 30 dias atrás das grades. Além de ter o nome idêntico ao real acusado do crime, ele nasceu em 14 de outubro de 1956, duas décadas antes de seu homônimo, cuja data de nascimento é 15 de outubro de 1976.

Trabalhador da construção civil, Sabino mora há dois anos em Londrina (PR), mas viveu por mais de 30 anos em Bauru, município que ainda consta como seu local de domicílio. Na “cidade sem limites”, ainda vivem sua ex-mulher, três filhos e nove netos, que ele visita com regularidade.
O pedreiro autônomo, aliás, estava na expectativa para a chegada de mais um neto quando, em 23 de janeiro deste ano, foi surpreendido por uma abordagem policial em Ibiporã (PR), cidade vizinha a Londrina. “Eu estava pescando e fui parado em um patrulhamento de rotina. O policial disse que eu era procurado, que tinha um mandado de prisão preventiva na Justiça contra mim”, relembra.

Foi quando o autônomo de vida simples e sem nenhum antecedente criminal descobriu que era acusado de ter matado um homem em fevereiro de 2000, em Barueri. Ele nem tinha ideia de onde ficava a tal cidade, muito menos que era procurado pela Justiça desde 2003. 

Ainda perdido em meio a toda confusão, foi encaminhado à Cadeia Pública de Ibiporã, onde teve início a pior experiência de sua vida. A situação deixou filhos, netos, a atual companheira e o próprio Sabino desesperados.

“Nunca esperava viver uma situação dessas. Passei um mês dividindo cela com 12 homens, entre eles (acusados de serem) traficantes, assassinos, assaltantes, homens que trocaram tiros com a polícia. Gente perigosa, mesmo. Foi um sofrimento”, revela.

Noites no chão
Por conta da superlotação, o “novato” Sabino teve de dormir no chão. Sem saber as regras da prisão, conversava apenas o essencial com seus companheiros de cela, mas escutava, com os olhos baixos, toda a comunicação que havia entre eles. 

“Como eu ficava quieto, ninguém mexia comigo. Eles usavam maconha, cocaína e crack o dia inteiro, a noite inteira. E conversavam bastante, naquela linguagem própria do crime”, conta o pedreiro, que acompanhou o planejamento dos detentos para uma fuga que foi consumada dias após ele reconquistar a liberdade (leia mais abaixo).

O banheiro insalubre, a comida pouco convidativa, o choro solitário, o ambiente sem ventilação que lhe arrancava o sono e a incerteza sobre o futuro fizeram  Sabino perder cerca de dez quilos em um mês. “Para você ter uma ideia, tive até um princípio de sarna. Vendo pela TV, eu imaginava que a prisão era ruim, mas não pensava que era tanto. Depois de tudo que vi, posso dizer, sem sombra de dúvidas: cadeia não recupera ninguém”, lamenta.

Apesar de desolado, ele conta que nunca perdeu as esperanças de sair do cárcere e voltar a ser um homem livre. A fé se transformou em certeza no dia 23 de fevereiro, quando o autônomo conseguiu, finalmente, provar sua inocência. Mas, como seu nome ainda não foi retirado do processo criminal, ele mantém o alvará de soltura, por garantia, o tempo todo guardado dentro do bolso.  

Depois de voltar para casa, não teve nenhum desejo extraordinário, além de retomar a rotina simples, mas honesta, que fez parte de toda sua vida. “Só queria tomar um banho quente, tirar tudo aquilo do corpo, comer uma comida gostosa e ficar tranquilo. Deus me livre de voltar para um lugar daqueles. Cadeia não é vida. Não é lugar para ser humano nenhum”, conclui.

‘Foi um erro terrível’
Segundo o advogado Sérgio Mangialardo, representante legal de Marcos Roberto Sabino, o Judiciário cometeu um “erro terrível” ao prender uma pessoa inocente, que correu “um risco enorme” ao ser colocado, por engano, em um ambiente completamente hostil. 

Para ele, o equívoco foi cometido após uma análise superficial de documentos por parte do responsável pelas investigações sobre o caso. 

“Procuraram o DVC (Divisão de Vigilância e Captura, banco de dados da polícia onde constam os antecedentes criminais) do suspeito, Marcos Roberto Sabino, e encontraram duas pessoas com o mesmo nome. 

Pode ter havido confusão com a semelhança de nomes, datas de nascimento e cidades de origem. Mas, no mínimo, fizeram uma leitura mecânica dos documentos, porque o endereço de residência do outro Marcos Roberto (o real acusado) era o mesmo do local do crime. Mas ninguém se atentou a este detalhe”, pontua.

Depois de ser procurado pela família do pedreiro autônomo, Mangialardo reuniu documentos para comprovar a inocência de seu cliente e os apresentou à 1ª Vara Criminal de Barueri. 

No mesmo dia, Sabino reconquistou a liberdade. O Marcos Roberto Sabino que é apontado como autor do homicídio, assim como um comparsa que também teria participado do crime, ainda é procurado pela Justiça.

Vida nova
Depois de viver o inferno na prisão, o autônomo Marcos Roberto Sabino tenta, aos poucos retomar a vida. E, na última sexta-feira, ganhou um novo motivo para recuperar a alegria: o nascimento de seu nono neto, em Bauru.

Já na segunda-feira, o avô coruja, que mora em Londrina (PR), veio conhecer o mais novo herdeiro, que recebeu o nome de Victor Hugo. Segundo o advogado Sérgio Mangialardo, a família toda estava preocupada com a possibilidade de o bebê nascer antes de Sabino reconquistar a liberdade.

“A filha dele, grávida, chegou a vir até meu escritório para perguntar se eu achava que o pai dela estaria livre a tempo de ver a neta nascer. Foi uma situação difícil, porque dependíamos de uma decisão judicial. Por sorte, no mesmo dia em que levei os documentos para Barueri para comprovar a inocência dele, a juíza expediu o alvará de soltura”, observa defensor.

Plano de fuga
Durante os dias em que ficou preso, o pedreiro autônomo Marcos Roberto Sabino acompanhou diálogos que faziam parte do plano de fuga de um grupo de detentos da Cadeia Pública de Ibiporã (PR). Alguns de seus companheiros de cela faziam parte do esquema, que foi posto em prática na madrugada do último dia 12, 18 dias depois de Sabino obter a liberdade.

“Nos dias em que estava lá, eles já estavam planejando sair da cadeia e perguntavam se eu ia fugir junto. Eu falava que não e eles diziam que eu ia apanhar. Ficava aquele clima de tensão, com medo do que poderia acontecer. 

Mas não tinha motivo para ir. Eu era uma pessoa inocente, não podia complicar ainda mais a minha vida”, comenta. 

De 65 detentos, 27 conseguiram ganhar as ruas após abrirem um buraco na parede do corredor do complexo carcerário que dá acesso ao pátio externo. Segundo informações da polícia local, os fugitivos teriam pulado o muro da unidade, que conta com cercas elétricas e arame farpado. 
(Fonte: JCnet)
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