Na tarde de uma quinta-feira de
fevereiro, a funcionária pública Daniele Medeiros Alvarenga cortava rabiolas
para enfeitar o telhado da casa, em São João de Meriti, no Rio de Janeiro. Era
seu aniversário de 33 anos. Daniele estava feliz. Pela primeira vez em três
décadas, queria festejar duas vezes. No sábado, a reunião familiar seria na
varanda. Assim que terminasse de preparar os enfeites coloridos naquela
quinta-feira, Daniele transportaria uma caixa de cupcakes até o cenário da
primeira comemoração: o Hospital Oeste D’Or, no Rio. Ela saíra de lá seis meses
antes. “Como dizem os
médicos, estou aqui por um milagre.” Por muito pouco, ela não se tornou mais uma vítima fatal
do desrespeito às recomendações da Organização Mundial da Saúde, a OMS, para o
uso seguro de pílula
anticoncepcional. A
pedagoga, que antes da licença-médica trabalhava como assessora na Câmara de Vereadores
de Mangaratiba, jamais poderia ter tomado um contraceptivo hormonal. Sabia que
era portadora de uma condição genética (conhecida como trombofilia) que aumenta
em até 30 vezes o risco de formação de coágulos na corrente sanguínea de
mulheres que usam hormônios. Os danos provocados por esse tipo de coágulo
costumam variar entre graves e irreversíveis: trombose nas veias, embolia
pulmonar, trombose nas artérias do cérebro, AVC, paralisia, morte. O drama de
Daniele começou no ano passado. Ela procurou uma ginecologista para tratar
cistos ovarianos, que causavam fortes cólicas menstruais. A médica ofereceu
duas opções: remover o ovário policístico ou usar uma pílula anticoncepcional
para tentar tratá-lo. Daniele optou por não fazer a cirurgia. Preferiu manter o
órgão porque pretendia engravidar. “Disse à ginecologista que era portadora de
um fator genético que aumenta o risco de trombose”, afirma. “Ela respondeu que,
nesse caso, receitaria uma pílula com baixa dosagem hormonal.”
(Época)