O Departamento Científico (DC) de Nutrologia Pediátrica da Sociedade
Brasileira de Pediatria (SBP) elaborou um pequeno questionário para ajudar
médicos e pacientes a entenderem as questões ligadas à intolerância à lactose,
ou seja, a incapacidade do organismo de absorver adequadamente um dos
carboidratos presente no leite (lactose). A forma correta de tratar o problema
costuma causar muitas dúvidas entre os pais. Para ajudar a sociedade a ter uma
melhor compreensão sobre o tema a dra. Jocemara Gurmini, membro do DC, preparou
10 perguntas e respostas mais frequentes sobre o tema. A seguir, o leitor
encontrará orientações gerais sobre o transtorno, que podem ser muito úteis.
1. No caso dos bebês, alergia ao leite
e intolerância à lactose são a mesma coisa?
A alergia ao leite de vaca e a intolerância à lactose são enfermidades
diferentes. Na intolerância à lactose estamos falando sobre um carboidrato
(lactose) que não provoca reações alérgicas, mas que por não ser absorvido de
forma adequada é processado pelas bactérias intestinais formando gases e
causando sintomas de desconforto abdominal, cólicas, distensão, flatulência,
evacuações amolecidas, às vezes explosivas, e dermatite perineal. A alergia ao
leite envolve a proteína, que, neste caso, ultrapassa a barreira mucosa do
intestino delgado e chega à corrente sanguínea. Fenômenos alérgicos variados
podem ocorrer, como sintomas digestivos (evacuações amolecidas, sangue nas
fezes, vômitos, baixo ganho de peso) ou reações em outros aparelhos e sistemas
(urticária, eczema ou, em casos mais graves, choque anafilático).
2. Em que idade costuma aparecer os
sintomas da intolerância?
A intolerância à lactose pode ser primária, como a deficiência do
prematuro; a congênita (rara); e a do tipo adulto ou ontogenética. A
intolerância à lactose secundária ocorre devido a algumas doenças que levam a
alterações na mucosa intestinal, alterando o tamanho das vilosidades, área onde
a lactase (enzima que digere a lactose) é produzida. Tal fato pode ocorrer na
doença celíaca, enterite infecciosa, desnutrição, entre outras. Outro dado importante refere-se ao fato de ser a intolerância à lactose
dose-dependente, isto é, talvez pequenos volumes de leite ou derivados sejam
bem tolerados. Algumas crianças toleram 1 a 2 copos de leite ao dia sem
presença de sintomas.
3. Quais são os sintomas em adultos e
em crianças? São os mesmos?
A quantidade de lactose necessária para desencadear os sintomas varia de
indivíduo para indivíduo, dependendo da porção de lactose ingerida, do grau de
deficiência de lactase e do tipo de alimento com o qual a lactose foi ingerida.
Os principais sintomas são: dor abdominal, borborigmo, distensão abdominal,
flatulência, diarreia aquosa explosiva, dermatite perianal, podem ocorrer
desidratação e acidose metabólica em caso mais graves.
4. Como descobrir se a criança
desenvolveu intolerância? Quando devemos levá-la ao médico?
Procure avaliação médica nos casos de sintomas acima citados antes de
iniciar uma dieta sem leite e derivados. Lembre-se que indivíduos com uma dieta
pobre em leite e derivados e sem a substituição ou complementação adequada
estão mais predispostos a desenvolverem uma mineralização óssea inadequada.
5. Caso a criança seja alérgica ou
tenha intolerância, como deve ser a dieta? O que pode substituir o leite? Quais
cuidados devem ser tomados?
Na alergia ao leite de vaca é necessária dieta sem leite e derivados com
atenção especial aos rótulos, pois o leite pode vir com outro nome, como: leite
em pó, leite desnatado, leite fluído, composto lácteo, caseína, caseinato,
lactoalbumina, lactoglobulina, lactulose, lactose, proteínas do soro, soro de
leite, whey protein. Atenção também para medicamentos e cosméticos. Na alergia
ao leite não consuma alimentos que contenham queijo, iogurte, manteiga, creme
de leite, leite integral, leite desnatado, leite em pó, leite condensado,
produtos preparados com leite e com derivados.
6. É genético?
A primeira descrição de intolerância à lactose foi feita por Hipócrates
400 a.C. e a redução da atividade da lactase ocorre com maior frequência em
alguns grupos étnicos (por exemplo: esquimós, judeus, orientais, indianos,
negros) que perdem progressivamente a atividade enzimática. Sua prevalência
pode variar de 10% a 90%, dependendo da etnia considerada. Postula-se que esta
variação na prevalência seja decorrente da seleção natural ocorrida em povos
criadores de gado leiteiro domesticado, consumidores de leite e seus derivados
na dieta, com a aquisição de um traço genético dominante que perpetua a
atividade da lactase após o desmame, selecionando indivíduos geneticamente
habilitados a digerir a lactose. Nestes casos, ocorre a persistência de um
“gene regulador”, recentemente sequenciado e localizado no cromossomo 2 (2q21),
que não permite a supressão da síntese de lactase no tempo programado. Apesar
desta descoberta, testes genéticos não tem função diagnóstica de intolerância a
lactose e não influenciam no tratamento.
7. Existe algum meio de prevenir a
alergia ou a intolerância à lactose?
Na intolerância à lactose não existem orientações de prevenção. Já na
alergia alimentar, faltam evidências de que a sensibilização inicie no período
intrauterino. Até o momento, há pouca evidência de que a dieta materna durante
a gestação e a lactação evitem a alergia. É importante estimular o aleitamento
materno exclusivo até os seis meses de idade, e complementado até dois anos ou
mais; e não retardar a introdução de alimentos sólidos e nem dos ditos “mais”
alergênicos (peixe, amendoim, castanhas, ovo, etc.) visando prevenir alergias.
Não há qualquer justificativa para se retardar a introdução dos alimentos
sólidos após o sexto mês de vida, sob o risco de aumento da sensibilização a
antígenos alimentares e possíveis manifestações de alergias, principalmente a
dermatite atópica.
8. Há níveis de intolerância?
A quantidade de lactose necessária para desencadear os sintomas varia de
indivíduo para indivíduo, dependendo da porção de lactose ingerida, do grau de
deficiência de lactase e do tipo de alimento com o qual a lactose foi ingerida.
9. Há tratamento? Ou é para a vida
toda?
A intolerância a lactose secundária e a do prematuro são transitórias, o
indivíduo volta a tolerar após um período de dieta sem o carboidrato. As demais
são para toda a vida.
10. Há algum número de quantas pessoas
no Brasil possuem intolerância a lactose?Não há dados quanto ao número exato de indivíduos com intolerância a
lactose.