"Se até semana passada os candidatos adotaram a estratégia de dividir os eleitores, a partir de agora sua tarefa será trabalhar pela reconciliação. Desde a redemocratização do Brasil, esta foi a primeira eleição presidencial que terminou com algo além das expectativas de praxe e da tradicional decepção de uns e regozijo de outros. Percebe-se no ar, pelo menos entre as pessoas sensatas e que se importam com o País, um clima de preocupação e incerteza no que se refere à governabilidade.
Pode parecer exagero - e tomara mesmo que seja -, mas a impressão que se tem é que o Brasil saiu diminuído da contenda, assim como os próprios candidatos. E que, pela primeira vez na história recente da democracia, o vencedor - a presidente Dilma Rousseff, reeleita com 51,6% dos votos válidos - enfrentará, além dos desafios próprios de um país em desenvolvimento e com mais de 200 milhões de habitantes, o risco de governar tendo nas mãos uma bomba-relógio, em cuja combinação explosiva entram doses elevadas de rejeição, impaciência, ódio exacerbado e não aceitação das regras do jogo.
Estas foram as eleições do grito. Os candidatos dedicaram muito mais tempo de suas campanhas a atacar os adversários do que a apresentar propostas. Parte da imprensa tomou partido, aberta ou veladamente, e colocou o jornalismo a serviço de candidaturas. Militantes se apropriaram das redes sociais para promover seus candidatos e achincalhar os opositores. E os assim chamados "cidadãos comuns", emulando o discurso nem sempre honesto e respeitoso dos militantes, engajaram-se no vale-tudo, em que o que menos se fez foi discutir programas de governo com argumentos civilizados.
Parafraseando uma máxima antiga sobre a guerra, a verdade foi a primeira vítima da batalha pelos votos. Mas não só ela: o respeito também saiu gravemente ferido, e, assim como ele, inumeráveis relações de amizade.
Uma teoria otimista afirma que tudo isso não deve ser levado muito a sério. Que os militantes raivosos do espaço virtual são uma minoria e não representam todo o povo brasileiro. Que o despreparo para o debate - em cujo rastro se materializam as agressões preconceituosas, as frases pejorativas e os xingamentos - levou essa minoria a fazer muito barulho e a ser considerada maioria.
É provável que essa teoria tenha um fundo de verdade. Pesquisa recente constatou que há muitas pessoas optando por não opinar sobre política nas redes sociais, para não ser incomodadas pelos patrulheiros de plantão. Para os que adotaram o silêncio, a fim de não piorar as coisas, exercer a democracia e as liberdades civis é mais importante do que perder tempo em discussões desgastantes e inócuas com militantes de cabeça feita."